Diana despedira-se de Selénia prometendo voltar em breve e
pusera-se a caminho. Passou ao largo da clareira e voltou ao caminho que levava
à citadela. Caminhava há já algum tempo quando ouviu o som das patas de um
cavalo a aproximar-se. Colocou o capuz na cabeça e procurou continuar o mais
calmamente possível. O seu coração batia mais depressa, pois nem tinha pensado
na eventualidade de encontrar alguém pelo caminho ou de alguém lhe poder
perguntar o que fazia ali. Ninguém podia suspeitar que voltava de uma visita à
Senhora do Bosque!
Os passos do cavalo ficavam cada vez mais
próximos e o seu coração batia mais depressa. Até que sentiu o seu dragão
latejar. Seria Rafael? Ele dissera que haviam mais dragões. E se não fosse?
Também sentiria na certa o seu dragão! O seu coração acelerava mais do que
pensara ser possível. Uma voz soou então.
- Não devíeis andar por aqui sozinha!
Impressão sua ou a voz lhe era familiar? Diana
olhou para cima, para aquele que acabara de chegar junto a si e, para seu
alívio, reconheceu o viajante, mesmo que a sua marca não estivesse à vista.
- Rafael!
- Perdida?
- De viagem. - respondeu sorrindo.
Ele perscrutava-a, mas nada encontrava.
Parecia que ela se tinha lembrado de correr a sua cortina.
- Também vindes de uma visita? - acabou por
perguntar Diana.
- Venho fazer uma... Sobe! Escusas de ir a pé,
sozinha!
Apesar de sentir algum receio, Diana agradecia
a oportunidade de poder obter mais alguma informação.
- Não preferis caminhar um pouco comigo, antes
de continuar caminho?
Rafael hesitou.
- Não preferes descansar da viagem, subir e
chegar logo? - disse estendendo a mão a Diana para a ajudar a subir ao cavalo.
- Preferia conversar um pouco! Tenho algumas coisas a
contar-vos...
Rafael receava as perguntas que pudessem
chegar, mas também queria saber mais. Acabou por descer do cavalo e
acompanhá-la a pé.
- O que tens para me contar? - perguntou.
- Uma noite destas sonhei com a minha mãe de
sangue e o momento em que recebi o meu dragão... No sonho ele voava do braço
dela para o meu! Ela dizia pressentir um perigo e dizia que teríamos de nos
afastar para minha protecção... Bem sei que dormia e sonhava, mas parecia tão
real...! Parece-vos que poderia ser a magia do dragão a revelar-me aquele
momento?
- Parece-me que tiveste uma visão... Que mais te mostrou?
- Nesse momento, apenas isso!
- Nesse momento?
Diana anuiu. Queria contar-lhe, apesar de não saber se deveria ou
como.
- Voltou a acontecer e... mostrou-me o momento
em que minha mãe me entregou à mulher que me criou, pedindo-lhe que... se algo
lhes acontecesse, a minha educação ficasse a cargo de um guardião chamado
Belchior!
Diana olhava-o com atenção e percebera que o
nome alterara algo na sua expressão. Rafael conhecia bem aquele nome. Tinha-o
ouvido muitas vezes na sua juventude. Belchior, o traiçoeiro! Mas não lhe
apetecia contar-lhe essa história, devia esquivar-se; escolher bem as palavras.
- Sabeis quem é? - ela perguntou impaciente.
- Não o conheço. Mas aqueles que primeiro
receberam o poder do dragão eram vistos como guardiões e muitas vezes chamados
como tal.
- E quem foram essas pessoas? Como receberam o poder do dragão?
Rafael respirou fundo. Estava a aproximar-se
de terrenos que não queria pisar. Achava que ainda não era o momento, mas o que
poderia dizer-lhe?
- Os deuses concederam o poder do dragão a um conjunto de homens,
entre eles druidas, reunidos com o intuito de proteger o conhecimento dos
antigos de tudo o que estava para vir no mundo dos homens. A seu pedido, esta protecção
foi-lhes concedida e o poder do dragão foi distribuído em seis partes e
por seis homens, os
guardiões, cada um deles reservando em si o poder de um dragão-elemento.
Eram estes os dragões: da água, da terra, do fogo, do ar, do sol e da lua. Cada
um destes homens, que havia demonstrado a sua lealdade à irmandade, continha em
si a magia e sabedoria do seu dragão, representado na sua pele de uma forma
mágica. A partir desse momento, o
poder do dragão é passado de geração em geração. O filho mais velho recebe este
poder e continua o ciclo.
Rafael calara-se, avaliando o que mais deveria dizer. Diana olhava
atentamente nos seus olhos, algo fascinada com a história da sua marca, e
incentivando-o a continuar, enquanto a sua mão segurava inadvertidamente o seu
pulso tatuado.
- Nós somos a terceira geração do dragão. - acabou por dizer.
- Isso significa que os nossos avós foram os primeiros guardiões?!
Rafael anuiu.
- Isso significa que este Belchior podia até ser o meu avô... Ou
conhecê-lo...!
Rafael
permanecia em silêncio. Não queria falar de Belchior.
-
Devo encontrá-lo!
-
Pode não ser possível. - diz Rafael, olhando em volta de sobrolho levantado.
Diana continua a olhá-lo, procurando descobrir os pensamentos que
ele parecia não querer partilhar; procurando o seu olhar. Até que decide,
finalmente, confrontá-lo.
- Parece que há algo que não me quereis contar... - disse,
colocando-se à sua frente.
Rafael
olha-a sem saber o que responder.
- Impressão tua. Pensava apenas há quantos anos terá acontecido
esse episódio... Esse homem pode já nem viver entre os homens! - e antes que
Diana colocasse a questão que parecia eminente, continuou - Tenho de pôr-me a
caminho, ainda tenho algo a fazer antes da noite chegar. Vamos?
Diana coloca a mão no braço de Rafael, segurando-o, com o intuito de
o impedir de subir no cavalo.
- Conta-me como se cruzam as histórias dos nossos dragões? Porque
disseste que não sabias se podias confiar em mim? Porque se querem matar?!
Rafael não contava com a sua frontalidade. Aquela era uma Diana
firme e decidida, diferente da que tinha conhecido até então.
-
Preciso saber. - insistia Diana, calmamente.
- É uma história longa e este não é o momento. - respondeu,
ajeitando as rédeas e subindo no cavalo - Aliás, falta pouco para chegarmos!
-
Quando será esse momento?
-
Vens? - perguntou ele ao estender a mão para a ajudar a subir.
Ela
estendeu o braço e aceitou a ajuda.
- Podes ir começando... Não sei quando nos voltamos a
encontrar...
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